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Saúde Mental Infantil e Técnicas Para Reduzir a Ansiedade nas Crianças: Uma Entrevista com a Psicóloga Cynthia Wood de São Paulo

Hoje, temos o privilégio de conversar com a Psicologa Infantil Cynthia Wood Passianotto, uma mineira de coração, mas que encontrou seu lar em São Paulo há mais de duas décadas. Sua história é permeada pela influência de uma família acolhedora, onde os laços se fortaleceram entre avós, tias e primos, despertando desde cedo sua paixão pelas crianças. Cynthia traz consigo uma bagagem rica em experiências, marcada pela união entre sua formação em Psicologia, iniciada na capital paulista em 1998, e sua jornada ao lado do marido, Luciano, também profissional da área. Juntos, eles compartilham não apenas uma vida em comum, mas também um compromisso dedicado à saúde mental, especialmente voltada para crianças e adolescentes. Hoje, Cynthia gentilmente se dispõe a compartilhar conosco sobre a sua prática e a importância da saúde mental infantil, mergulhando em sua especialidade em Psicologia Comportamental e Cognitiva, assim como na Neuropsicologia voltada para os mais jovens.



Como você aborda a individualidade de cada paciente, considerando suas necessidades e contextos únicos?

Em um primeiro momento no consultório atendo os pais onde faço uma anamnese bem detalhada onde procuro entender como aquela família funciona, qual motivo da procura do meu atendimento e como posso ajudá-los da melhor maneira possível. Depois marco o início das sessões da criança ou adolescente, onde procuro entender como ele se sente, quais seus gostos, quais suas dores. Alguns casos precisam de uma avaliação detalhada e realizo uma bateria de testes da Avaliação Neuropsicológica para entender o funcionamento Cognitivo e Emocional da Criança para a partir daí fazer os atendimentos com o foco no que ela realmente precisa. Sempre respeitando a individualidade de cada criança e abordando os temas necessários de forma lúdica.


Como você percebeu a necessidade de uma abordagem mais focada e direcionada ao "problema" em seu trabalho com crianças, adolescentes e famílias?

Quando iniciei meus atendimentos percebi que os pais sofrem muito junto com os filhos. Que quando uma criança passa por medo, ansiedade, tristeza, dificuldades escolares os pais passam por tudo isto junto e que um atendimento rápido e focado no problema e naquela dor faz a família inteira ficar bem. Por este motivo escolhi a Terapia Comportamental e Cognitiva para me especializar. Ela trás dinâmicas práticas e rápidas que faz com que a criança se desenvolva rapidamente. 


Pode compartilhar uma experiência específica em que notou a eficácia da abordagem interativa e ativa do psicólogo na prática clínica da Terapia Cognitiva Comportamental?

Sim, lógico! Tive muitos casos de sucesso nestes 22 anos de atendimento a crianças e adolescentes. Mas, vou contar um recente. Após a pandemia e muitas crianças estarem trancadas por muito tempo com aulas online, excesso de eletrônicos o dia todo, pois não podiam sair e os pais trabalhando em home-office. Tive um caso de um menino de 5 anos que estava muito agressivo, não querendo voltar a escola, sair para brincar ou passear. Ele só queria ficar em casa o tempo todo. Batia na mãe quando ela tentava arrasta-lo para escola, ou para qualquer outra atividade. Ela trouxe ele para Terapia e ele no início não aceitava, gritava muito, chorava. Logo percebi que ele estava viciado nos eletrônicos, uma criança tão pequena, e com todas as suas horas do dia voltado as telas. E agressividade veio por conta da abstinência,  por conta de tentarem tirar todas aquelas horas de tela a força de uma vez só para voltar a vida normal pós pandemia. Aos poucos fui trabalhando com a mãe e criança para tentar habituar ele na rotina aos poucos. Ao invés de pular para 5, 6 horas na escola de uma vez, fui trabalhando de ele começar por 30 minuto, no outro dia 1 hora, no outro duas horas, até que em poucos dias ele conseguiu estar na escola. Depois fizemos o treinamento de diminuir as telas de pouco em pouco até que em menos de três meses ele passou a usar as telas uma hora e meia por dia. Para quem usava 16 horas , isso foi muito difícil, e para que isso acontecesse fomos expondo ele a novas brincadeiras, novas diversões,  novas histórias,  até que ele foi descobrindo do que gostava. Poi neste tempo recluso de pandemia 1 ano, para uma criança de 5 anos foi uma eternidade e ele realmente achava que nada era interessante e não gostava de mais nada além das telas. Quando descobriu os legos, as massinhas, as tintas, o contato com a natureza virou outra criança. Mas, tudo isso foi sendo mostrado aos poucos, buscando perceber no ambiente de terapia o que ele realmente focava mais. Pois quando a mãe tentava sem terapia ele gritava, ela ficava frustrada também e a raiva vinha. Ambos na terapia aprenderam a respirar, se acalmar quando estavam nervosos, pensar e quando mais calmos conversarem sobre seus medos e tentar juntos resolver as questões. Foi tão impactante que de um menino agressivo, passou a um menino calmo que na escola passou a ajudar outras crianças.


Como a motivação do paciente para a ação se destaca durante o processo terapêutico, especialmente ao utilizar essa abordagem?

Digo sempre aos pacientes que com motivação o tratamento acaba muito mais rápido. Por isso é importante achar dinâmicas que tenham haver com a situação do paciente, mas ao mesmo tempo que gostem, que sintam prazer em realizar aquelas tarefas. O importante é eles aprenderem a regular as emoções brincando. Assim, nunca vão esquecer de como fazer em nenhuma situação. 


Como você envolve os pacientes no processo terapêutico?

Como atendo crianças e adolescente minha sala de terapia é muito colorida, tem muitos brinquedos, livros, material para arte. Tudo para que eles consigam através do brincar expressar suas angústias e eu possa intervir e ajudá-los mostrando os mais diversos caminhos e as mais diversas formas de resolver para que escolham qual a melhor maneira para eles e aprendam a solucionar sozinhos. Eu estou lá para ouvir,  acolher e dar as ferramentas, mas quem escolhe o caminho e constrói uma nova vida é eles. O sucesso é deles! E eu fico muito orgulhosa com cada conquista e cada tchau no meu consultório.  Quando eles vão embora e batem as asas eu me sinto realizada por ter estado ali participando deste crescimento.



Quais habilidades específicas os pacientes adquirem ao longo do processo terapêutico, especialmente no que diz respeito a lidar com emoções como ansiedade, tristeza, agressividade, melancolia e depressão?

Eu sempre trabalho com eles a Regulação das Emoções,  conversamos sobre todas as emoções, através de jogos e brincadeiras identificamos o que precisam de trabalhar. Qual emoção é mais difícil de controlar e aos poucos vão aprendendo ferramentas para controlar. Sempre explico que não existe emoção ruim ou boa. Todas as emoções são necessárias,  precisamos apenas de um balanço para que elas não sejam excessivas e percamos o controle. A maior habilidade que aprendem é controlar isto. Ensino sempre aos pais como trabalhar as emoções nas crianças e as crianças a reconhecerem o que está sentindo e a pensar em possíveis soluções sem entrar em desespero. 


Quais são os principais objetivos que você estabelece ao iniciar o atendimento com uma nova criança?

O principal objetivo é tentar descobrir os gatilhos emocionais de cada criança. Descobrir o que levou a acontecer determinados sentimentos, o que está por trás daquilo, é importante trazer a tona a raiz do problema. Fazer a criança entender o que gerou aquilo e aprender soluções de como lidar da maneira adequada quando o gatilho emocional disparar novamente. 


Pode compartilhar um caso de sucesso em que tenha observado um notável aumento na capacidade de enfrentar desafios em um paciente?

Tive um paciente que tinha medo de tudo, 8 anos, uma criança inteligente, mas extremamente ansiosa. Tinha medo de ir a qualquer lugar e fazer qualquer coisa. Sempre imaginava desfechos terríveis para cada coisa , então nem tentava, já que entraria em pânico devido ao medo. Aos poucos na terapia fomos trabalhando técnicas para reduzir a ansiedade e contornar a situação. Entre elas ensinei:


Respirar fundo: Em momentos de crise, para evitar hiperventilação. É importante contornar esse sintoma, respirando profundamente. A respiração feita dessa maneira aumentará a oxigenação do cérebro e reduzirá o estresse. Esse procedimento deve ser feito até que a criança esteja mais tranquilo.


Fechar os olhos: Além de auxiliar no processo de respiração, os olhos fechados ajudam na concentração e no bloqueio de estímulos externos.


Relaxar os músculos: Durante uma crise, os músculos tendem a ficar tensos. Por isso, deve-se tentar relaxar cada grupo muscular por vez.


Praticar o “pare e substitua”: Essa técnica consiste na troca de pensamentos negativos, que estimulam o estresse e o medo, por pensamentos positivos, que trazem alegria e paz. Ou seja, ao invés de pensar no que pode dar errado, mudar o foco e pensar no que pode dar certo.


Reconhecer o problema: Reconhecer que está em crise e analisar o medo que isso causa são importantes fatores de ajuda nesses momentos. Pergunte: esse medo é real? Qual o motivo para estar com esse sentimento? Outra dica é tentar eliminar possibilidades, cortando da mente o “e se”.


Praticar atividades físicas: A prática de atividades físicas é um importante agente  na prevenção de crises. Exercícios físicos liberam endorfina, hormônio que proporciona bem estar, tranquilidade e felicidade.


Concentrar em algo que proporcione prazer: Atividades que distraem a mente ajudam a esquecer os problemas e medos. Ter hobbies, fazer artesanato, pintura, aula de música, jogar futebol, ir ao cinema. Vale tudo para ocupar a cabeça com coisas que trazem alegria e tiram o foco do que pode causar crises.


Este paciente de apenas 8 anos aprendeu tudo isso em 6 meses e ensinou a mãe a lidar com as crises de ansiedade dela.  Ela me contou que o tratamento valeu por dois, ambos aprenderam a contornar a ansiedade.


Em sua experiência, qual é o papel da família no processo terapêutico, especialmente ao lidar com crianças e adolescentes?

A família é uma peça fundamental neste processo terapêutico. Quando a família coopera, a criança e adolescente se sente mais confiante e consegue ir em frente com mais facilidade e autonomia, já que tem amparo e apoio. E quando a escola coopera junto o desenvolvimento é mais rápido ainda. Precisamos de pensar que uma criança, uma família tem uma comunidade, uma escola por trás e se um ajuda o outro esta rede de apoio se forma e a vida se desenvolve mais plena.


Como você avalia e mede o progresso terapêutico ao longo do tempo, especialmente em termos de crescimento e capacidade de enfrentamento?

Em um primeiro momento de terapia faço como falei a a anamnese com os pais e avaliação da criança.  E conforme o tratamento ocorre vamos reavaliando a criança,  seu progresso emocional e de aprendizado. Quando vejo que a terapia cumpriu o seu papel, que a criança atingiu a meta proposta, dou alta.


Quais são os desafios mais comuns que você encontra ao trabalhar com crianças, e como os supera?

O maior desafio no processo da terapia é quando alguma pessoa envolvida no cuidado diário com a criança não coopera com as metas estabelecidas, fazendo com que a criança tenha um retrocesso. Por exemplo: Uma criança em terapia por estar com seletividade alimentar e uma avó permite muitos doces para ela. Uma criança em tratamento para o medo e um irmão mais velho ou tio conta e mostra muitas histórias assustadoras para ela. Uma criança em tratamento para timidez que fala pouco e está em tratamento, mas que um pai sempre antecipa suas necessidades,  pegando algo antes dela solicitar, ou respondendo por ela quando alguém pergunta algo, antes da criança tentar responder. Isto atrapalha e atrasa o processo da terapia. Nestes casos tenho que chamar a pessoa envolvida explicar o porque isso atrapalha o processo da criança,  entender suas angústias e ansiedades, mostrar que a criança é um ser em desenvolvimento que é capaz, que não precisam de ter dó,  etc...


Como você vê o futuro da psicologia, especialmente no  contexto do atendimento a crianças, e quais desenvolvimentos espera ver na área?

No futuro um dos grandes focos que devem nortear o desenvolvimento da psicologia deve ser o desenvolvimento de novas tecnologias para mapeamento de como o indivíduo funciona entre elas desenvolvimento da neuroimagem e de mapeamento genético para descobrir melhor por onde deve se ir a prevenção e tratamento de muitas doenças mentais. Isto possibilitará uma intervenção precoce nas crianças e maiores possibilidades de desenvolvimento. Também acredito que  teremos cada vez mais um trabalho multidisciplinar de escuta e ajuda as mais diversas crianças e famílias.



Cynthia é uma Psicóloga formada pela Universidade São Marcos, pós-graduada em Psicoterapia Infantil e do Adolescente pelo CEFAS e pós-graduada em Psicopedagogia pela PUC-Campinas.



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